Capa de um especial do Le Monde sobre o Brasil de 2010. "Um gigante se eleva" |
É sempre muito interessante notar qual visão um
povo estrangeiro tem de nós brasileiros, principalmente quando estamos no
território deles. Um sentimento parecido com o de chegar em uma festa,
descobrir no hall que estão falando de você e por isso permanecer lá quietinha
e anônima alguns segundos para ouvir clandestinamente qual opinião a seu
respeito.
A primeira vez em que estive na França, em 2001,
Brasil era "o maior e mais populoso país da América Latina cuja capital é
Brasília, uma moderna cidade planejada de ares futuristas projetada pelo grande
arquiteto Oscar Niemeyer..." e por aí vai (sim, eles sabem tudo isso, franceses não são americanos, graças ao Bon
Dieu), mas ainda assim extremamente exótico,
distante e desconhecido. Hoje, mais de dez anos depois, o som da palavra “Brésil” desperta
um sorriso ainda curioso, porém muito mais encantado e cheio de admiração. Não
mais apenas pelo futebol ou pelo samba e Carnaval. Todos (unanimidade) amam a
figura do Lula, viram nele o personagem do Brasil pobre e marginal que chegou
ao poder (o que faz vibrar o espírito revolucionário e socialista de qualquer francês)
sabem que elegemos uma mulher (opa, outro ponto para nós), que bem ou mal segue
o “legado” do governo anterior* , nos vêem como economia pulsante,
pungente, como um país em franco desenvolvimento (ao meu ver infelizmente
apenas econômico e não educacional/cultural, mas aí meu bem, papo longo),
sempre ensolarado e sorridente (já começa a mítica) e lançador de modismos e
tendências. E neste último quesito estão certos. O Brasil está mesmo em voga.
As tradicionais espadrilles
(alpargatas de tecido e solado de corda) são os calçados oficiais do verão
europeu, mas se você é verdadeiramente
cool andará por Paris ou St. Trop com um belo par de... Havaianas. Oui. A marca, que não é boba
nem nada, abriu inclusive tem uma loja no... Marais. O arrondissement mais fervido da ville.
Todo salon de
coiffeur que se preze tem no menu da vitrine dois itens obrigatórios: Lissage
brésilien - Sim, acreditem se quiserem, nossa escova progressiva
alisando geral a juba da moçada enfants de la Patrie... E Maillot brésilien - mais
conhecida na Califa, NYC e adjacências como brazilian
wax, aquela “virilha cavada” ixxperrtha que dez anos atrás só a Marlene
da Silva, top depiladora do salão do seu bairro sabia fazer. Pois bem, já
dominou geral. Todas querem ser brasileiras. O que ainda não se popularizou, malheuresement, é a bendita abençoada manicure brasileira (aquela que tira as
cutículas, lixa e esmalta com perfeição), mas nos salões mais branchées, os mais sofisticados e caros,
as manicures são brasileiras. Talvez portanto seja só uma questão de tempo para
a Manicure Bresiliénne virar febre.
Fui com um grupo de amigos e amigas franceses em um
pub de Saint Germain, na rue des Princesses, coração do Quartier
Latin. Voilá, um calor dos infernos dentro daquele lugar e eles
adooramm, "uhuul, verão, vamos suar". E eu morrendo, pedi ao barman “une
boteille d´eau minerale, si vous plait”. (Se pedir une verre d´eau
ou carrafe d´eau te dão água torneiral mesmo, que matar não mata, mas
ainda estou estudando os efeitos, rs) Pois bem, um segundo depois, a música do
bar mudou. O que começou a tocar? “ERA UM MENINO TOCADÔ QUE DISPENSÔ O
AGOGÔ E O TAMBÔ PRA TOCÁ LATÁÁÁ”, Daniela Mercury berrando lá nos
idos de 1990 e tralálá, estão lembrados?
Em momento algum ninguém perguntou minha nacionalidade. Mas pelo “accent” fui identificada e já imediatamente “premiada”. Ou punida, entendam como quiserem. O que se seguiu foi Vanessa da Mata em dueto com Ben Harper em “Boa Sorte” e de volta à programação normal, porém sempre com um pé na latinidade, o barman que era também o DJ (multitarefas, a gente vê por aqui. Reflexos da crise, talvez?) mandou ver com Shakira e arrematou com salsa. É, da salsa não precisava. Vi que era hora de partir.
Em momento algum ninguém perguntou minha nacionalidade. Mas pelo “accent” fui identificada e já imediatamente “premiada”. Ou punida, entendam como quiserem. O que se seguiu foi Vanessa da Mata em dueto com Ben Harper em “Boa Sorte” e de volta à programação normal, porém sempre com um pé na latinidade, o barman que era também o DJ (multitarefas, a gente vê por aqui. Reflexos da crise, talvez?) mandou ver com Shakira e arrematou com salsa. É, da salsa não precisava. Vi que era hora de partir.
Mas a homenagem musical do pub não foi de todo ruim
e isso só fui notar no dia seguinte, quando ouvi no coiffeur o rádio a
toda: TCHE TCHERERE TCHE TCHE TCHE TCHE TCHE TCHE, GUSTAVO LIMA E VOCÊ!
Depois da semi síncope de vergonha, a bichinha cabelereira de Avignon (que
usava lentes de contato coloridas, la pauvre) me perguntou porque eu não
gostava da música... se todo mundo adorava... Me perguntou o que quer dizer a
letra... (QUE LETRA?) e também quis saber de Michel Teló, obviamente.
Ficou chocadíssima em saber que o significado de "Ah, se eu te pego" (essa pelo menos tem algum, por mais
pífio que seja) é “Ah, si jê t´attrape”... Essa era uma fama
que eu preferia que o Brasil não tivesse... ou se tivesse que fossem por outros
méritos musicais, mas enfim, como eles não compreendem a letra, talvez não apreciariam
tanto um samba da nova geração como Roberta Sá ou qualquer coisa similar de
mais requintado. É música para as massas, o que importa é o ritmo, e esse pegou. E
é... é... é do Brasil, sil, sil. Por bem ou por mal, estamos na moda.
Aceite.
Nas rodas mais cultas, a literatura é sempre tema.
Aí nos saímos com mais classe. Citam Paulo Coelho, mas a estrela mesmo é Jorge
Amado. "Que sorte você tem de poder ler Jorge Amado no original, em
português, sem intervenção de tradutores... E saber de tudo aquilo que ele
fala, da Bahia, dos temperos, das frutas, os cheiros..." Quer
saber? Tenho sorte mesmo. <3>3>
*Apenas reprodução do discurso que escuto sobre a
visão deles da nossa política. Longe de mim entrar nesse mérito. Sério.
Um comentário:
Ma, estou amando cada vez mais suas postagens. Sério. haha
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