segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Notícias versus Literatura





       Um pensamento embalado em poesia musical que me é muito recorrente: “O sol na banca de revista... me enche de alegria e preguiça. Quem lê tanta notícia?” 

A preguiça caetaneada da abundância de informação impressa em 1967 viraria verdadeiro pânico no contexto digital atual, onde além das centenas de jornais e revistas ainda há um sem número de portais, sites, blogs. Me pergunto de fato o porquê de tudo aquilo, mesmo sabendo que há quem leia, que (por mais incrível que possa parecer) para todo tipo de site e blog há público. Mas nunca me vem tal pensamento em uma enorme livraria ou biblioteca. Com títulos do mundo inteiro, autores dos mais diversos estilos de narrativas, podem ser andares altíssimos tomados de livros até o teto. Sinto uma alegria enorme de estar ali em meio a tanta história, tantas possibilidades de uma leitura prazeirosa, um deleite antecipado só pela ideia de poder degustar algumas daquelas páginas. E aí está a grande diferença. As notícias, artigos e matérias de jornais, revistas e sites, periódicos de modo geral, de cunho jornalístico, documental, são efêmeras, um tanto quanto descartáveis. A notícia de amanhã substituirá a de hoje, assim como a de hoje substituiu a de ontem, que já está embrulhando peixes na feira, num ciclo sem fim e frenético, ritmo que a mim,  produtora de palavras, me desinteressa, me desencanta. Já os livros são perenes, perpétuos. Por isso a cada dia me vejo menos jornalista e mais escritora. Talvez não romancista, mas observadora de costumes e comportamentos, uma cronista do cotidiano, uma articulista de bastidores, porém não mais repórter, desprovida de opinião e imparcial.  

Escrever pensamentos autorais em blog e compartilhá-los é um pouco como aquela deliciosa conversa despretensiosa entre amigos, em que (guardadas as proporções tempo e espaço) um assunto puxa o outro de forma natural e espontânea. No post sobre as cartas, citei “O Rio é tão longe”, cartas de Otto Lara Resende ao amigo Fernando Sabino. O texto foi bem comentado por amigos nas redes sociais e três deles, inspirados pelos temas amor ou “correspondências que viraram obras literárias” e sabendo de meu amor pelos livros, me recomendaram novos títulos dentro do mesmo contexto. “Fragmentos de um discurso amoroso”, de Roland Barthes, “Minhas queridas”, cartas de Clarice Lispector às irmãs e “Cartas perto do coração”, correspondências trocadas entre Fernando Sabino e Clarice Lispector por mais de 20 anos de amizade. Amizade esta que, dizem os mais conhecedores dos grandes nomes de nossa literatura, era na verdade um grande amor, que não se concretizou por circunstâncias mil da vida de ambos. 



Por todos me interessei, mas deste último, talvez atraída pela história de amor frustrado, fui buscar  alguns trechos. Os lendo me dei conta de que as cartas relatam acontecimentos, portanto fatos, notícias. Mas notícias de sentimentos, percepções, que se compartilha com os amigos ou amor, viram de alguma forma uma realidade romanceada, literatura em potencial. Me identifiquei em especial com um trechinho de uma carta de Lispector ao amigo depois de uma viagem à França em companhia do marido diplomata. Tive um verdadeiro cansaço em Paris de gente inteligente. Não se pode ir a um teatro sem precisar dizer se gostou ou não, e porque sim e porque não.”

Clarice, minha querida... sei bem...



Aos franceses, ainda mais parisienses, sobra opinião, são abundantes os argumentos, é necessária a constante troca de ideias. Isso é intelectualmente instigante mas também cansativo.  E é algo que identifiquei como fato mesmo e vem desde a formação da cidade, a quem interessar possa um livro que traz muito sobre o tema é "A história secreta de Paris", do historiador Andrew Hussey

E voilá um post criado sob o efeito enebriante e perturbador do verão europeu (pior do que o nordestino, eu vos garanto), sobre tudo e sobre o nada. Cartas, amores, livros, Paris, meu desencanto com a mídia e minha vontade sonhadora de realidades mais romanceadas. 


3 comentários:

Luiz Alvaro disse...

Você pode até achar que Paris já foi melhor mas eu defenderei que ela tem te servido bastante de musa inspiradora.

Seja no compartilhar das notícias do seu dia a dia, seja nas cartas que você manda, ou não, estou adorando.

Beijo.

Nádia disse...

Concordo 100% com você, Má! Antes, eu queria ser uma jornalista informada, que trabalha com coisas realmente relevantes para a sociedade. Mas, de uns tempos pra cá, cheguei à conclusão de que o relevante é subjetivo. E o relevante pra mim, felizmente ou infelizmente, não está nos jornais, mas, sim, nos livros. Por isso, continuo sendo jornalista for a living... mas na minha vida real e particular, só livros, histórias e textos como este seu ;)

beijos

Juliana Cunha disse...

To adorando que vc está inspirada em Paris. Seus textos são gostosos de ler :)